
A indústria automotiva da China vive um paradoxo: ao mesmo tempo em que lidera a revolução dos carros elétricos no mundo, enfrenta um cenário de competição tão agressiva que ameaça implodir o próprio setor.
Em vez de ser uma corrida por lucros, a disputa virou uma guerra de sobrevivência entre mais de 50 montadoras, segundo o jornal The New York Times, onde o preço mais baixo vale mais que qualquer estratégia de longo prazo.
Nos últimos meses, a venda de carros elétricos e híbridos plug-in ultrapassou metade do total de veículos comercializados no país.
Mas esse avanço vem acompanhado de uma avalanche de problemas:
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São fábricas produzindo muito mais do que o mercado comporta, redes de fornecedores sem receber em dia, bancos públicos sendo pressionados a financiar projetos cada vez mais arriscados e concessionárias abarrotadas de estoques que ninguém consegue vender.

Pequim finalmente decidiu intervir. Em um encontro liderado por Xi Jinping, o governo criticou o que chamou de “involução” da indústria — termo usado para descrever uma competição excessiva e destrutiva.
Mesmo assim, as medidas para conter a escalada têm surtido pouco efeito. A orientação para que as montadoras paguem seus fornecedores em até 60 dias, por exemplo, foi ignorada por quase todas as empresas privadas do setor.
A situação é tão crítica que até gigantes como a BYD sentiram o impacto. Apesar de ser a maior fabricante de EVs do planeta, a empresa viu seus lucros despencarem quase 30% no segundo trimestre deste ano.
A explicação? A queda brutal nos preços para manter participação de mercado, mesmo com margens apertadas e custos operacionais em alta.

O excesso de capacidade não é uma exclusividade do setor automotivo. É um velho problema da economia chinesa, movida a investimentos estatais e incentivos para expansão desenfreada.
Mas no caso dos EVs, o efeito colateral foi amplificado por uma corrida tecnológica impulsionada por milhares de engenheiros recém-formados, salários baixos e fábricas que nascem quase da noite para o dia.
Hoje, a China conta com mais de 120 marcas vendendo veículos elétricos. Estimativas indicam que apenas 15 delas sobreviverão de forma sustentável até 2030. As demais dependem de investidores com bolsos fundos ou de apoio estatal para continuar operando.
Enquanto isso, montadoras estatais como FAW, Dongfeng e Changan seguem focadas nos modelos a combustão, resistindo à necessidade de encolher suas operações para dar espaço ao novo mercado.

Outro sintoma dessa bolha é o aumento das exportações. Com o mercado doméstico saturado, cerca de 20% da produção nacional agora é enviada para o exterior.
Isso transformou as montadoras chinesas em potências globais — ao custo da indústria automobilística de outros países, gerando atritos comerciais e sanções.
Apesar do caos, a inovação segue acelerada. Modelos como o Yangwang U9, da BYD, fazem “danças hidráulicas” com o carro em movimento.
Já o SUV Bao 8 vem com um drone que decola do teto e transmite imagens direto para o painel, com edição feita por inteligência artificial. A Zeekr, marca da Geely, oferece vans de luxo com poltronas que viram redes e divisórias entre motorista e passageiros.

Essa avalanche tecnológica vem garantindo espaço no mercado interno e dificultando a vida de concorrentes estrangeiros. A Tesla, por exemplo, que foi pioneira no segmento na China, hoje amarga quedas nas vendas e falta de lançamentos relevantes.
O foco no Cybertruck e a ausência de modelos acessíveis para o consumidor chinês abriram espaço para que empresas locais ganhassem terreno com força.
Enquanto isso, o governo tenta equilibrar o jogo, mas sem mexer nas peças mais pesadas: as estatais ineficientes, os financiamentos sem critério e o excesso de fábricas.
Em meio ao turbilhão, a indústria de EVs chinesa segue em alta velocidade — sem saber se está prestes a cruzar a linha de chegada ou colidir com o muro da própria ambição.
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