A corrida para a eletrificação no setor automotivo está esbarrando em questões éticas alarmantes.
Segundo o relatório Recharge for Rights da Anistia Internacional, os maiores fabricantes de veículos elétricos (EVs) estão falhando em demonstrar como mitigam riscos de direitos humanos nas cadeias de suprimentos de minerais críticos, como cobalto e lítio, essenciais para baterias.
O relatório avaliou 13 grandes fabricantes de EVs com base em critérios como comprometimento com direitos humanos, mapeamento de cadeias de suprimentos e medidas de remediação, segundo reportagem da revista Wired.
A Mercedes-Benz liderou o ranking com 51 pontos em 90 possíveis, enquanto a chinesa BYD, maior fabricante mundial de EVs, ficou em último lugar, marcando apenas 11 pontos.
A BYD foi criticada pela falta de transparência sobre as origens de seus minerais e métodos de produção. Outras empresas de baixa pontuação, como Hyundai e Mitsubishi, também apresentaram políticas vagas, sem evidências claras de implementação.
Mais de dois terços do cobalto mundial vêm da República Democrática do Congo (RDC), onde a pobreza extrema afeta 70% da população.
Cerca de 25% desse cobalto é extraído por meio de mineração artesanal, muitas vezes realizada manualmente, em condições perigosas e envolvendo trabalho infantil.
Embora alternativas possam ser exploradas, a Anistia argumenta que abandonar a RDC não é a solução ideal, pois impactaria ainda mais os pequenos mineradores. A organização defende que as empresas de EVs utilizem seu poder de compra para exigir melhores condições de trabalho e maior segurança.
Alguns fabricantes responderam ao relatório da Anistia. A Mitsubishi destacou esforços recentes, como o uso de IA para monitorar conexões com fornecedores associados a minerais de conflito.
Hyundai e Nissan reafirmaram seu compromisso com cadeias de suprimentos éticas, enquanto Mercedes-Benz destacou sua posição de liderança no ranking.
Apesar dessas declarações, a Anistia sublinha que muitas promessas permanecem vagas e longe de atender aos padrões internacionais de sustentabilidade.
Novas regulamentações nos EUA, Europa e Japão aumentam a pressão sobre as empresas para melhorar suas cadeias de suprimentos.
A União Europeia, por exemplo, introduziu a Diretiva de Diligência Corporativa em Sustentabilidade, que exige monitoramento rigoroso e pode multar empresas que violem normas em até 5% de sua receita global.
Nos EUA, o Inflation Reduction Act (IRA) também restringe incentivos fiscais para empresas com componentes provenientes de “entidades estrangeiras preocupantes,” como as chinesas.
Especialistas acreditam que o momento atual é uma chance única para transformar cadeias de suprimentos. A Volvo já aderiu à iniciativa SteelZero, comprometendo-se a usar aço sem fósseis, e a Mercedes-Benz fez compromissos semelhantes.
Chris Alford, da Sunrise Project, enfatiza que a indústria automotiva tem poder de compra suficiente para pressionar outras indústrias, como aço e alumínio, a se descarbonizarem.
“Com os EVs, temos uma oportunidade de transformar essas cadeias de suprimentos e abordar os impactos ambientais e humanos,” afirmou.
A Anistia também vê os litígios como uma ferramenta poderosa para responsabilizar empresas.
Recentemente, a mineradora BHP concordou em pagar US$ 29,85 bilhões ao Brasil após o rompimento da barragem de rejeitos do Rio Doce em 2015, estabelecendo um precedente para ações futuras.
Apesar de avanços, Mark Dummett, líder do relatório Recharge for Rights, alerta que os desafios permanecem.
Com possíveis mudanças políticas, como o retorno de Donald Trump nos EUA, há preocupações sobre o enfraquecimento de regulamentações críticas para direitos humanos e sustentabilidade.
O relatório conclui que, enquanto alguns fabricantes dão passos na direção certa, muito ainda precisa ser feito para alinhar a transição para EVs com valores éticos e sustentáveis.
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