Poucos lembram, mas antes de Elon Musk se tornar o homem mais rico do mundo, ele precisou de uma ajuda decisiva do governo americano para colocar a Tesla de pé.
Em janeiro de 2010, a então nascente fabricante de veículos elétricos recebeu um empréstimo de 465 milhões de dólares do Departamento de Energia dos Estados Unidos (DOE), através do Loan Programs Office (LPO).
Esse dinheiro foi crucial para que Musk pudesse adquirir a fábrica de Fremont, adaptá-la para a produção de baterias e veículos, e colocar em marcha o projeto que viria a se tornar o Model S.
Quinze anos depois, a situação é, no mínimo, irônica: Musk, hoje muito mais alinhado a políticas de corte de gastos do que a investimentos públicos, está apoiando medidas que praticamente desmantelam o mesmo programa que impulsionou seu sucesso.
Sob a atual administração do Department of Government Efficiency (DOGE), criada para reduzir custos no governo federal, o LPO foi alvo de uma verdadeira “tomada hostil”, como descreve uma reportagem da Latitude Media, resultando na dispensa de mais de 1.200 funcionários e no corte de mais de 60% da equipe do programa, com novas reduções previstas.
O problema é que o LPO não era apenas uma iniciativa pública bem-sucedida, mas também um dos poucos programas federais que geravam receita para o governo.
A função do escritório era justamente financiar projetos de alto risco e alto impacto, como startups de veículos elétricos ou projetos de energia nuclear — iniciativas que os bancos tradicionais evitam, pois o retorno financeiro demora a se materializar.
A decisão de enfraquecer o LPO pode ter consequências sérias para o futuro da energia limpa nos Estados Unidos.
Já há impactos concretos: empresas como Kore Power e Freyr Battery cancelaram planos de construir fábricas de baterias no Arizona e na Geórgia, respectivamente, devido ao congelamento dos financiamentos.
A Aspen Aerogels também suspendeu a construção de uma nova planta para a produção de barreiras térmicas para baterias de EVs.
Até a gigante PG&E alertou que seu empréstimo de 15 bilhões de dólares para infraestrutura corre risco, o que poderá gerar aumento nos custos para os consumidores.
Especialistas do setor energético, incluindo a American Nuclear Society, enviaram uma carta ao Secretário de Energia, alertando que a falta de apoio técnico especializado poderá paralisar projetos essenciais para manter a competitividade dos EUA, especialmente no desenvolvimento de energia nuclear voltada para alimentar data centers de inteligência artificial.
A ironia, como destacam analistas, é que muitos dos avanços que levaram à popularização dos EVs, incluindo o sucesso da própria Tesla, só foram possíveis graças à atuação do LPO.
Empresas como Rivian e Lucid também se beneficiaram direta ou indiretamente desse tipo de suporte.
Agora, ao minar essa base de apoio, Musk e o DOGE podem estar comprometendo o futuro da indústria americana de veículos elétricos e da energia limpa, em uma das decisões mais autodestrutivas e controversas dos últimos anos.
Enquanto isso, o mundo assiste perplexo à cena de um bilionário puxando a escada pela qual subiu, deixando para trás todo um setor que ajudou a construir.

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