O que era uma guerra comercial focada em semicondutores, softwares e redes de comunicação agora chegou até os pneus.
A mais nova vítima do cerco regulatório dos Estados Unidos contra produtos ligados à China pode ser a tradicional fabricante italiana Pirelli, mais especificamente seus pneus inteligentes equipados com sensores de alta tecnologia — e com laços acionários com o governo chinês.
Desde que o Departamento de Comércio dos EUA finalizou, no início de 2024, uma nova norma proibindo a venda e importação de sistemas de hardware e software de veículos conectados oriundos da China e da Rússia, especialistas já apontavam que a lista de alvos poderia crescer.
Agora, esse cerco atinge um componente que muitos ainda consideram “analógico”: o pneu.
Em questão está a tecnologia batizada de Cyber Tyre, lançada pela Pirelli em 2021.
Trata-se de um sistema que vai muito além da simples borracha. Os pneus possuem sensores internos que informam o veículo, em tempo real, sobre uma série de dados: temperatura, pressão, tipo de pneu, índice de carga e velocidade.
Esses dados são processados por um software próprio da Pirelli, integrado ao sistema eletrônico do carro. Com isso, é possível calibrar com precisão os sistemas de assistência ao motorista, melhorando a segurança e o desempenho dinâmico.
O problema? A empresa italiana tem hoje 37% de suas ações controladas pela estatal chinesa Sinochem.
E, para o governo dos EUA, essa conexão pode ser suficiente para barrar o uso dos pneus com essa tecnologia, por representar um risco potencial à segurança nacional.
Segundo o governo Biden, a preocupação é que qualquer ponto de coleta e transmissão de dados em um carro conectado — mesmo algo aparentemente inofensivo como um pneu — possa ser explorado para fins de espionagem ou controle remoto.
Com base nas novas regras, a proibição do uso de softwares chineses em veículos entrará em vigor a partir do ano-modelo 2027.
Já a restrição para o hardware, como os sensores dos pneus, passa a valer em 2030.
Isso coloca montadoras que adotaram a tecnologia da Pirelli em uma situação delicada, podendo precisar buscar isenções específicas para continuar utilizando o sistema — algo que, até o momento, ainda não está claro se será viável ou simples.
Apesar do tom político, o impacto comercial também é evidente.
A Pirelli pode perder acesso a um dos maiores mercados de automóveis do mundo, enquanto as montadoras que apostaram na integração profunda entre pneus e sistemas de direção semi-autônoma terão que rever suas estratégias para os modelos voltados aos EUA.
Esse episódio mostra como, na nova era dos veículos conectados, nenhum componente está livre da tensão geopolítica.
Até mesmo um pneu pode ser considerado um ponto sensível de vulnerabilidade tecnológica.
E a corrida por soluções que aliem inovação, desempenho e soberania nacional — tanto para os fabricantes quanto para os governos — deve se acirrar ainda mais nos próximos anos.
Quer receber todas as nossas notícias em tempo real?
Acesse nossos exclusivos: Canal do Whatsapp e Canal do Telegram!