
O mercado automotivo chinês vive uma tempestade perfeita. Cortes agressivos nos preços, fábricas operando com capacidade ociosa e um governo que perdeu o controle estão mergulhando a indústria em um cenário cada vez mais caótico.
A líder do setor, BYD, tem adotado uma postura extremamente agressiva para dominar o mercado, mas mesmo ela já perdeu mais de US$ 21 bilhões em valor de mercado desde maio.
A tentativa do governo de Pequim em conter os danos parece cada vez mais ineficaz. Recentemente, convocou os principais executivos do setor para um encontro na capital e criticou o que chamou de “competição de corrida de ratos”.
A recomendação oficial: não vender carros abaixo do custo e evitar promoções “irracionais”. Só que isso já havia sido tentado antes, sem sucesso. Em 2023, um pacto entre 16 montadoras, incluindo Tesla, BYD e Geely, para coibir os descontos durou apenas dias.
Mesmo com a retração de fabricantes menores, a China ainda utiliza menos da metade da sua capacidade produtiva.
Segundo dados da Gasgoo Automotive Research, a taxa média de utilização em 2024 foi de apenas 49,5%. Essa superprodução, aliada à demanda mais fraca, alimenta uma guerra de preços que ameaça até as montadoras mais consolidadas.
A situação tem impactos em todos os elos da cadeia. Concessionárias de BYD em duas províncias já fecharam as portas desde abril.
Fabricantes como Jiyue, apoiada por Geely e Baidu, reduziram drasticamente a produção pouco mais de um ano após o lançamento de seu primeiro modelo.
Investidores também desconfiam dos balanços: uma análise da GMT Research sugere que a dívida real da BYD pode ser 11 vezes maior que o número oficial, ultrapassando os US$ 45 bilhões.
Enquanto isso, consumidores chineses hesitam em comprar, temendo que os preços caiam ainda mais nas semanas seguintes. Essa incerteza mina a confiança no mercado e ameaça a reputação internacional dos carros “Made in China”.
A pressão por corte de custos também levanta dúvidas sobre a qualidade e segurança dos veículos entregues.
A tentativa de exportar o excedente de produção enfrenta barreiras geopolíticas. Os Estados Unidos estão praticamente fechados para os elétricos chineses. Japão e Coreia do Sul devem seguir o mesmo caminho.
A Rússia, que foi o maior mercado de exportação em 2023, já não oferece a mesma estabilidade. E o sudeste asiático perdeu o apelo estratégico que tinha até pouco tempo.
Em meio ao caos, analistas como John Murphy, do Bank of America, alertam para uma inevitável consolidação em massa. Marcas pequenas e frágeis serão engolidas ou desaparecerão.
O próprio Murphy aconselha que montadoras dos EUA, exceto a Tesla, abandonem o mercado chinês, que segundo ele está se tornando arriscado demais.
Para o consumidor final, os descontos parecem uma boa notícia, mas escondem um problema muito maior.
A crise no setor automotivo chinês não é apenas sobre preços baixos. É uma disputa por sobrevivência que pode redefinir o futuro da mobilidade elétrica no país — e no mundo.
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