A Tesla atravessa um dos momentos mais complexos de sua história recente.

Apesar dos resultados financeiros negativos, das entregas em queda e da crescente concorrência no mercado de veículos elétricos, as ações da montadora subiram mais de 20% na última semana.

O fenômeno, que ignora completamente os fundamentos da empresa, evidencia um novo perfil para a Tesla no mercado financeiro: a companhia se tornou um verdadeiro “meme stock”, negociada muito mais com base na fé em seu CEO, Elon Musk, do que nos resultados de suas operações.

Os números do último trimestre revelam um cenário preocupante. Tesla registrou seu pior desempenho em anos, ficando muito aquém das expectativas de analistas.

As entregas de veículos diminuíram consistentemente desde 2024, acompanhadas de uma queda acentuada nas margens automotivas.

Mesmo com o crescimento das vendas de sistemas de armazenamento de energia, o lucro da empresa só se manteve positivo graças à venda de créditos regulatórios — e não por sua atividade principal.

O único setor que ainda proporciona fôlego à Tesla, a divisão de energia, também enfrenta incertezas.

A dependência de baterias chinesas, agora sujeitas a tarifas de importação nos Estados Unidos, e o avanço de concorrentes locais como CATL e BYD no setor de armazenamento de energia, apontam para novos desafios no horizonte.

No entanto, o mercado parece ignorar esses sinais.

O valor de mercado da Tesla permanece inflado por uma narrativa criada e alimentada por Musk: a promessa de que a empresa estaria próxima de dominar a tecnologia de direção autônoma e, futuramente, de robôs humanoides.

Essa aposta, até hoje, não foi comprovada com dados concretos.

A liderança de Elon Musk se tornou, simultaneamente, o maior ativo e o maior passivo da Tesla.

De um lado, sua figura carismática e visionária ainda atrai investidores e mantém a ação da companhia em níveis fora da realidade dos balanços financeiros. De outro, sua atuação cada vez mais política, polêmica e errática afasta clientes e parceiros, impactando diretamente as vendas de veículos.

Desde 2020, Tesla lançou apenas um novo produto, o Cybertruck — cuja recepção no mercado tem sido decepcionante.

Musk também insiste há anos em prometer a chegada iminente da direção autônoma total, algo que continua fora do alcance da tecnologia atual, apesar dos inúmeros anúncios e prazos não cumpridos.

Na prática, a Tesla segue atrás de concorrentes como Waymo e Baidu, que já realizam centenas de milhares de viagens autônomas semanalmente.

A deterioração da imagem de Musk, somada à falta de novidades relevantes no portfólio de produtos, começa a pesar no desempenho da Tesla. Contudo, muitos investidores ainda hesitam em pressionar por mudanças na liderança.

A razão é simples: há um medo generalizado de que a saída de Musk provoque uma queda brutal no valor das ações — o que, considerando a dependência da empresa da sua imagem pública, é um risco real.

Hoje, a Tesla ostenta uma relação preço/lucro (P/E) de 165, um número considerado absurdo tanto para o setor automotivo quanto para o setor de tecnologia.

Em qualquer cenário racional, essa avaliação não se sustenta frente aos números da companhia.

Sem a crença inabalável de que Musk conduzirá a Tesla para um futuro dominado por veículos autônomos e robôs inteligentes, o valor de mercado da empresa seria drasticamente menor.

O dilema é claro: manter Musk à frente garante a continuidade da bolha de expectativas, mas ameaça o futuro da operação real da empresa; retirá-lo poderia dar à Tesla a chance de um reposicionamento estratégico, mais alinhado com a realidade de mercado, mas ao custo imediato de uma provável desvalorização expressiva das ações.

[Fonte: Electrek]