Com declarações polêmicas, ambições quase futuristas e produtos que desafiam expectativas (e, às vezes, o bom senso), Musk tem talento para dominar as manchetes — mesmo que a realidade do mercado diga outra coisa.

Quando o Cybertruck foi revelado, a promessa era de uma revolução sobre rodas. Visual agressivo, estrutura em aço inoxidável, resistência a tiros (literalmente, segundo Musk) e desempenho digno de supercarros.

No entanto, quase um ano e meio após o início das entregas, a realidade bateu à porta da Tesla: as vendas não acompanham o hype.

Entre novembro de 2023 e fevereiro de 2025, foram entregues 46.096 unidades do Cybertruck — um número modesto diante das mais de um milhão de reservas alardeadas por Musk meses antes do lançamento.

Com base em estimativas do setor, a taxa de conversão ideal entre reservas e vendas varia de 2% a 16%. O número da Tesla ficou abaixo de 5%, dentro do esperado, mas bem distante da empolgação inicial, isso se é que as 1 milhão de reservas eram mesmo reais.

A empolgação, inclusive, parece ter durado pouco.

Embora o Cybertruck tenha liderado brevemente o segmento de veículos acima dos US$ 100 mil nos EUA no primeiro semestre de 2024, essa é uma fatia pequena e extremamente exclusiva do mercado.

Já os modelos abaixo dessa faixa de preço — onde estão as vendas de volume — continuaram dominados por concorrentes com propostas mais convencionais (e mais acessíveis).

Em janeiro, surgiram relatos de que a Tesla estaria transferindo funcionários da linha do Cybertruck para a do Model Y, seu modelo mais vendido.

A justificativa oficial envolveu “adequação de cronogramas”, mas fontes internas revelaram que o motivo real era a desaceleração nas vendas da picape.

Enquanto isso, a empresa aposta forte na nova geração do Model Y, chamada de Juniper, que deve estrear em breve para tentar recuperar terreno perdido.

E se engana quem pensa que Musk está preocupado com as metas do Cybertruck. Em uma reunião com funcionários em março, ele desviou completamente o foco para outro projeto: o robô humanoide Optimus.

Segundo ele, a Tesla pode fabricar 5 mil unidades ainda este ano, com ambição de chegar a 50 mil — ou até 100 milhões anuais, dependendo do “astral” do dia. A comparação com legiões romanas (e o entusiasmo desmedido) mostram que Musk continua vivendo no limite entre o gênio e o excêntrico.

O paralelo com Júlio César — que, ao atravessar o Rubicão, mudou o curso da história — parece inevitável. Como César, Musk desafia ordens estabelecidas e busca dominar novos territórios, sejam eles industriais, tecnológicos ou simbólicos.

Resta saber se seu reinado será duradouro ou se, como no caso do líder romano, ele também terá seu “15 de março” inesperado.

Enquanto isso, a Tesla ainda tenta traduzir o barulho em resultados. O Cybertruck segue chamando atenção — seja por sua aparência, polêmicas ou acidentes —, mas o que antes parecia um divisor de águas agora se comporta mais como um produto de nicho.

Se a Tesla quiser dominar o mercado de picapes elétricas como prometeu, terá que voltar às pranchetas, talvez com menos aço inox e mais foco no consumidor médio. Porque, no fim das contas, hype não enche o tanque — nem a bateria.