
A revolução dos carros elétricos na China está provocando um efeito colateral pouco discutido, mas cada vez mais preocupante: o colapso do setor de seguros automotivos.
Mesmo com milhões de EVs nas ruas e as vendas em ritmo acelerado, as seguradoras não conseguem acompanhar as mudanças no perfil dos motoristas, nos custos de reparo e na dinâmica de risco dos novos veículos — e estão acumulando prejuízos bilionários.
Segundo a Associação Chinesa de Atuários, o setor perdeu cerca de 5,7 bilhões de yuans (mais de R$ 4 bilhões) apenas em 2024 com a subscrição de seguros para veículos elétricos.
E o pior: essa tendência negativa já dura ao menos três anos consecutivos. Tudo isso ocorre mesmo com os donos de EVs pagando prêmios entre 20% e 100% mais caros do que os de carros a combustão.
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O problema vai além da precificação. Motoristas de elétricos — em sua maioria mais jovens — têm quase o dobro de chance de acionar o seguro em comparação aos proprietários de carros convencionais.
Além disso, os reparos desses veículos custam mais, em parte porque os sistemas de bateria são complexos, sensíveis e caros, chegando a representar até um terço do valor do carro.
Um simples impacto pode causar danos sérios no conjunto, elevando os custos do sinistro.
Alguns motoristas ainda burlam o sistema. Muitos que utilizam os EVs para aplicativos de transporte se registram como usuários residenciais, pagando menos por apólices, mas gerando mais riscos.

Esse tipo de distorção, somado à rápida chegada de novos modelos e à falta de dados históricos confiáveis, tornou o cálculo atuarial uma espécie de tentativa e erro constante.
Segundo especialistas, como Qin Lu da corretora Aon, as seguradoras ainda não conseguiram diferenciar com precisão marcas, modelos e padrões de perda.
O resultado é que muitas estão operando no escuro e, por ora, lucrar com seguros de EVs parece uma missão distante — talvez apenas daqui a três anos.
Para piorar, algumas empresas já começaram a recuar. Há casos de seguradoras que elevaram os prêmios a níveis proibitivos ou simplesmente deixaram de oferecer cobertura para veículos elétricos.

Ainda assim, as vendas de EVs seguem crescendo — o que mostra que, por enquanto, o custo do seguro não está espantando o consumidor.
Na tentativa de evitar um colapso no setor, o governo chinês lançou em janeiro a plataforma “Easy to Insure”, conectando motoristas de EVs a seguradoras dispostas a oferecer cobertura.
Mais de 500 mil veículos já foram assegurados pela ferramenta, que visa garantir acesso, mesmo sem controlar os preços.
A regulação do setor também é rígida: as seguradoras não podem recusar clientes, nem negar o seguro obrigatório de trânsito.
Além disso, as autoridades exigiram redução no custo de peças e consertos para os novos veículos, e pediram mais compartilhamento de dados entre montadoras e seguradoras para melhorar os modelos de risco.
Mesmo com esses esforços, o desafio permanece. Em 2024, o índice combinado médio das seguradoras para veículos elétricos foi de 107% — ou seja, para cada 100 yuans arrecadados, 107 foram gastos com indenizações e custos operacionais.
Empresas como a Ping An conseguiram lucrar no segmento privado, mas rivais como PICC e China Pacific ainda amargam perdas com EVs comerciais.
O futuro do seguro automotivo na China passa obrigatoriamente por ajustes nesse setor. A previsão é de que os prêmios com EVs ultrapassem os 500 bilhões de yuans até 2030, representando mais de um terço de todo o mercado de seguros de automóveis.
Mas para isso acontecer com viabilidade, será preciso reconstruir modelos de avaliação de risco e rever toda a cadeia de pós-venda.
Como resumiu Paul Low, CEO do Asian Institute of Insurance: “Lucro é importante, mas as seguradoras também têm uma responsabilidade social. O sucesso da mobilidade elétrica na China depende, em parte, da capacidade de oferecer seguros acessíveis e sustentáveis.”
Até lá, o setor continuará em modo de sobrevivência — tentando segurar o volante de uma transformação que não mostra sinais de desaceleração.
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