Superprodução, fraudes e carros abandonados: a crise invisível que ameaça destruir o império automotivo da China

china transito (1)
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À primeira vista, o que parece um paraíso para quem quer comprar um carro novo na China esconde uma realidade sombria.

Em um shopping nos arredores de Chengdu, cidade com mais de 21 milhões de habitantes, a loja Zcar oferece veículos zero quilômetro com descontos que desafiam a lógica: SUVs de sete lugares por cerca de R$ 115 mil e Audis nacionais pela metade do preço.

Mas há um motivo nada glorioso para isso: a China tem carros demais e consumidores de menos.

O colapso silencioso da indústria automotiva chinesa já é considerado por analistas como um “ciclo vicioso”. Durante anos, o governo incentivou a produção desenfreada de veículos com subsídios, metas agressivas e políticas públicas que privilegiaram volume e não demanda.

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O objetivo era transformar a China em uma potência global no setor automotivo e nos EVs — e deu certo, até demais.

china ev 2
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O país agora enfrenta um excesso de marcas, fábricas e estoques, segundo reportagem da Reuters , que está sufocando concessionárias, afundando lucros e empurrando modelos novos para revendas de “carros usados” com zero quilômetro no odômetro.

A Zcar, por exemplo, afirma comprar em grandes lotes diretamente de fabricantes ou revendedores encalhados. O negócio é vender barato, muitas vezes no prejuízo, só para girar o estoque.

Isso porque as montadoras chinesas continuam produzindo como se o mercado ainda estivesse crescendo — e não está. Hoje, a capacidade instalada na China permitiria fabricar o dobro dos 27,5 milhões de carros produzidos no ano passado.

Para tentar bater metas de vendas e garantir bônus das montadoras, muitas concessionárias chegaram ao ponto de registrar e segurar seguros de veículos que nem sequer foram vendidos, apenas para constar como “comercializados”.

Depois, esses carros são empurrados para o mercado paralelo, vendidos como “seminovos”, mesmo que nunca tenham rodado um metro.

china salao automovel evento
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Os incentivos não param por aí. Governos locais oferecem terrenos abaixo do valor de mercado e bilhões em subsídios para atrair fábricas. Em troca, exigem metas de produção e arrecadação.

Assim, montadoras seguem produzindo sem considerar a real demanda, mantendo empregos e impostos, mas gerando bolhas que lembram as crises do setor imobiliário e da indústria solar.

Com tantas marcas e modelos, a concorrência virou uma corrida autofágica. A palavra da vez entre executivos do setor é “involução”: quando a competição é tão intensa que deixa todos mais fracos.

Apenas 30% das concessionárias chinesas operam com lucro. Algumas até preferem vender com até 20% de prejuízo para garantir o recebimento de bônus — o que, em certos casos, compensa a perda.

Carros encalhados e esquecidos viraram paisagem comum em pátios tomados pelo mato. Leilões judiciais tentam limpar o estoque de empresas falidas, com lotes inteiros de veículos zero km sendo vendidos por um quarto do preço original.

yuan pro china 1
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Alguns desses modelos chegam a plataformas como Alibaba, onde são oferecidos a preços ridiculamente baixos. Em outros casos, influenciadores fazem lives vendendo carros zero km com descontos de até 60% — é a liquidação digital da superprodução.

O impacto não é só doméstico. Enquanto marcas como BYD e Geely tentam expandir para mercados internacionais, governos na Europa e nos EUA veem a enxurrada de carros chineses baratos como ameaça direta às suas indústrias locais.

Os americanos, inclusive, já adotaram restrições severas, citando riscos econômicos e de segurança.

Mesmo com toda essa pressão, poucos acreditam em uma quebra repentina do setor. A expectativa é de uma consolidação lenta, com dezenas de marcas desaparecendo nos próximos anos.

Estima-se que apenas 15 das atuais 129 marcas de EVs e híbridos na China serão financeiramente viáveis até 2030. Ainda assim, muitas montadoras seguem pedalando — como disse um executivo chinês, “é como andar de bicicleta: se você parar, cai”.

O que está em jogo vai além do setor automotivo. Como ele representa cerca de 10% do PIB chinês, o colapso pode se espalhar por toda a economia.

E enquanto montadoras inflacionam vendas, concessionárias lutam para sobreviver e carros novos apodrecem nos pátios, o governo parece não ter encontrado ainda o freio de mão para essa corrida desenfreada.

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Autor: Eber do Carmo

Fundador do Notícias Automotivas, com atuação por três décadas no segmento automotivo, tem 20 anos de experiência como jornalista automotivo no Notícias Automotivas, desde que criou o site em 2005. Anteriormente trabalhou em empresas automotivas, nos segmentos de personalização e áudio.


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